Aprendizados do Portfólio com Forest Trends e lideranças das Terras Indígenas Zoró e Sete de Setembro

Nossa Floresta Nossa Casa é uma parceria estratégica da USAID e PPA, implementada pela Iniciativa Comunidades e Governança Territorial da Forest Trends (ICGT-FT) com o apoio do Greendata. O projeto atua junto às organizações e iniciativas econômicas de 8 Terras Indígenas (TIs) na Amazônia Brasileira, nos estados de Rondônia e Mato Grosso, sendo elas: Igarapé Lourdes, Kwazá do Rio São Pedro, Rio Branco, Rio Mequéns, Roosevelt, Sete de Setembro, Tubarão Latundê e Zoró.

No âmbito na restauração ecológica com fins econômicos, a Forest Trends irá implantar nos próximos meses 350 mil mudas de espécies florestais em sistemas agroflorestais, de mais de 50 espécies diferentes. A atividade se constitui como uma oportunidade promissora para o incremento da renda, segurança  alimentar e a autonomia indígena, com a diversidade de frutos, óleos, essências, amêndoas, fibras e sementes para artesanato, plantas medicinais e outras de grande ocorrência nesse tipo de floresta, que recobre as Terras Indígenas de atuação do projeto. Devido à proximidade com as moradias, o manejo e monitoramento é facilitado, principalmente para as mulheres e jovens indígenas.

Além das mudas florestais, será utilizada a restauração com objetivo ecológico, via semeadura direta, pelo método da muvuca, em 40 hectares de área degradada das TI, sendo 30 hectares na TI Zoró e 10 hectares na TI Sete de Setembro. Além da implantação dessa área, as iniciativas indígenas estão passando pelos processos de formação e capacitação em semeadura direta para implantação e manutenção de suas áreas de restauração ecológica, no qual, está sendo aprimorado o conhecimento técnico e a autonomia dos indígenas para a futura implantação de novas áreas.

No âmbito da Campanha Caminhos para a Amazônia, Suellen Mangueira (Consultora da Forest Trends), Uraan Anderson Suruí (Presidente do Conselho de Administração da Cooperativa Suruí de Desenvolvimento e Produção Agroflorestal Sustentável –  COOPSUR) e Alexandre Zoró (Presidente da Associação do Povo Indígena Zoró – APIZ) concederam uma entrevista sobre as suas parcerias e ações ligadas à regeneração/restauração florestal.

Confira a seguir a entrevista na íntegra:

PPA: Vocês podem falar um pouco sobre como a Iniciativa Comunidades e Governança Territorial da Forest Trends (FT), a APIZ e a COOPSUR têm trabalhado a frente de regeneração/restauração florestal em suas diferentes linhas de ação?

Suellen: A gente está trabalhando em duas frentes de ação dentro dessa estratégia do reflorestamento, em Rondônia e Mato Grosso. Uma dessas ações é por meio do sistema agroflorestal com mudas. Serão plantadas neste ano 350 mil mudas em 8 Terras Indígenas, além do plantio direto de sementes (muvuca), pilotos nas TIs Sete de Setembro e Zoró. Queremos ver como essa estratégia se comporta em duas TIs diferentes. Para isso, estamos contando com a Rede Sementes do Xingu, Ecoporé, APIZ e COOPSUR. A muvuca é uma mistura de sementes que plantamos direto na terra. Para isso, fizemos junto com a parceria da APIZ e COOPSUR um levantamento de paisagens a serem restauradas. Temos alguns entraves para a restauração, pois essas áreas pegam foto corriqueiramente, ou mesmo têm a presença de capins exóticos. Mas esse diagnóstico foi muito importante para executarmos esse projeto. Nós da FT ficamos muito satisfeitos, pois atendemos demandas da própria APIZ e da COOPSUR, que possuíam uma grande preocupação em restaurar o seus territórios. Juntos estamos buscando solucionar esse problema da degradação da paisagem.

Anderson: Já faz alguns anos que trabalhamos com esse projeto do Nossa Floresta Nossa Casa. Uma das discussões centrais e um dos objetivos gerais dos povos indígenas e entidades parceiras é, com certeza, a preservação do meio ambiente e da floresta sem deixar de nos desenvolver como pessoas, famílias e povos. Esse potencial existente traz uma grande esperança para nós. Como trabalhar com isso é um dos grandes desafios e a parceria com a FT tem trazido um ânimo enorme. (…) Reflorestamento a gente vê a longo prazo e os benefícios também, de maneira que a inserção dessa cultura e desse pensamento de querer preservar de uma forma consciente e responsável, mas com um viés econômico, deve ser fundamental para a sustentabilidade do projeto em si. São os humanos que vão direcionar isso e levar isso adiante. 

PPA: Qual a importância das ações ligadas à regeneração/restauração florestal  desenvolvidas pela Forest Trends para o incremento da renda, segurança alimentar e a autonomia indígena?

Suellen: Isso é uma preocupação que temos. Queremos que seja não apenas um reflorestamento, um processo de restauração, mas também uma forma de trazer geração de renda, segurança alimentar e autonomia para esses povos. Com a restauração, buscamos a inserção de espécies que tenham esse potencial. Eles contribuirão com esses pilares, por meio da diversificação de frutos, espécies potenciais de óleos essenciais, amêndoas, sementes para artesanato, resgate das plantas medicinais, entre outras. Algo bem interessante de trazer é que temos vários relatos de espécies importantes que ficaram fora da área de demarcação, por exemplo a castanha. Eles perderam muitas áreas e, com isso, muitas espécies importantes para a cultura deles. Dentro do projeto, teremos diversas frutíferas que, a curto prazo, trarão segurança para a segurança alimentar e, a longo prazo, vão possibilitar a comercialização.

A COOPSUR, por exemplo, quer trabalhar com mel no futuro. Por isso, nessas áreas de restauro estamos incluindo espécies atraentes para as abelhas. No caso do restauro da APIZ é uma outra vertente: eles buscam retornar a vida animal para o local… Cada uma das duas áreas tem uma história diferente, muito bonita e de um resgate muito forte.

PPA: Anderson, como foi implantar o sistema cooperativista com a COOPSUR, já que ele depende de decisões coletivas, e como seu povo tem recebido a parceria com o projeto Nossa Floresta Nossa Casa da Forest Trends, apoiado pela PPA? Em que grau você considera que esse arranjo trouxe avanços para o trabalho da cooperativa?  

Anderson: A força da coletividade e essa percepção de que o coletivo faz a diferença são coisas que nos trazem muita esperança. Os cooperados têm a sua própria voz, os seus próprios desejos e suas próprias decisões. E um projeto como este só nos fortalece. A perspectiva é que outros projetos sejam duradouros e se tornem ainda mais fortes do que uma ou outra família beneficiada. A cooperativa tem seus cooperados, mas também tem seus beneficiários indiretos… De alguma maneira, um projeto inserido dentro da COOPSUR acaba abrangendo tudo isso e vemos que a vida das pessoas mudou para melhor. A segurança alimentar e o plantio de produtos que depois podem ser vendidos, por exemplo, são grandes ganhos para nós.

PPA: Os povos indígenas também fazem regeneração a milhares e milhares de anos. Como se dá essa troca de conhecimento tradicional com os técnicos?

Anderson: Ainda não conseguimos tirar uma experiência muito concreta, devido à pandemia. O pessoal está se encontrando agora e daqui para frente essa troca mais deve acontecer. Mas vejo que ela acontecerá de forma muito igual, pois temos muita experiência, sobretudo os nossos mais velhos… Com o nosso envolvimento no plantio, teremos uma troca de conhecimento bastante interessante.

Suellen: Isso é o que a gente se pergunta todo dia. De que forma vamos levar e absorver a informação em campo. O que deixamos claro nas comunidades é que os não indígenas dão nome para o que os indígenas sempre fizeram. Temos estudos que falam sobre as frutíferas cultivadas por indígenas na Amazônia. O roçado tradicional é um SAF, a muvuca é dos povos indígenas. A nossa maior preocupação ao chegar na comunidade é fazer com que eles visualizem que aquilo é deles. 

PPA: E de que forma têm ocorrido os processos de envolvimento, formação e capacitação dos povos indígenas para atuação nessas linhas de ação que vocês indicaram? Como acontece o manejo e o monitoramento das atividades?

Suellen: Sabemos que projetos tem início, meio e fim e sempre falamos isso para as comunidades. Buscamos parceiros que busquem, também, a autonomia dos povos. E buscando essa autonomia dos processos, a FT vem capacitando 30 jovens indígenas (15 da COOPSUR e 15 da APIZ) com orientações técnicas e sobre o manejo.

A parte prática vai acontecer no momento do plantio, para que eles entendam o que é feito, como é feito e como teremos esse cuidado com o monitoramento a longo prazo. Iniciamos agora com a TI Zoró e lá na COOPSUR vamos iniciar, provavelmente, na segunda quinzena de dezembro. 

Anderson: Vemos isso com bastante alegria. A participação do jovem dentro da cooperativa é maciça: são quase 55% dos cooperados. Uma iniciativa como essa, que pensa a longo prazo e com uma mentalidade sustentável, visando a autonomia e segurança alimentar, nos traz que o projeto não se configura como uma experiência somente, mas se converte em áreas produtivas, para que tenhamos a floresta novamente. Mas além das áreas degradadas, conseguimos ter um sustento da família. Inserir a juventude dentro dessa visão da proteção territorial e da governança, como gerir isso, é fundamental para nós. Tenho certeza que o projeto trará excelentes frutos.

Para acompanhar a série “Aprendizados do Portfólio” e a campanha Caminhos para a Amazônia da PPA, acesse: www.ppa.org.br/caminhosamazonia